Além do café, iniciativa abriu oportunidades para outras culturas e família agora também está no mercado de grãos
Por: Virgínia Alves
Fonte: Notícias Agrícolas
A cada ano que passa o Cerrado Mineiro vem se destacando na produção de café. A região, que conta com o maior município produtor de café arábica do Brasil, é considerada uma potência quando se fala em tecnologia de ponta, vem se destacando com as ações sustentáveis no campo e tem lugar garantido quando o assunto é café especial. Apesar de toda tradição que envolve a cidade de Patrocínio, para Alice Nunes a virada de chave com a produção de café é recente.
A cafeicultura vem de uma família também tradicionalmente conhecida pela produção leiteira na cidade e foi em 2016 que, pela primeira vez, pensou em investir na produção de café. Em uma prosa boa e de tarde quente na fazenda em Patrocínio/MG, duas características inconfundíveis do universo cafeeiro, Alice conta que além de se encontrar no parque cafeeiro, o café abriu as portas para outras culturas, como por exemplo soja e milho nos últimos anos.
Fazendo uma linha do tempo, Alice lembra que desde muito pequena já acompanhava o pai nas atividades na fazenda. O pai, “Tião leiteiro” – como é conhecido na região, hoje com 83 anos, já alcançou o título de terceiro maior produtor de leite do Brasil – com uma média de produção de 18 mil litros por dia no passado, mas a resistência com o café vinha pelas questões financeiras e políticas cafeeiras aplicadas na época. “Meu pai é muito conservador, trabalhou a vida toda com gado leiteiro, mas não queria fazer café porque perdeu dinheiro com o café naquele ano que o governo confiscou todas as sacas de café com a justifica de ajustar os preços, isso há 60 anos”, comenta.
A virada de chave aconteceu em 2017, com o primeiro plantio, quando o marido, Ricardo Augusto Costa Mundim, passou a olhar o café como uma oportunidade de avançar com os negócios no campo, mas foi Alice quem levou a ideia até o pai e concretizou o início do plantio. “Apesar das condições que sempre tivemos, ele nos ensinou tudo para caminharmos sozinhos. Nada veio de “mão beijada” e foi assim que aprendemos a fazer tudo que tinha no campo”, conta.
Com suporte do marido, Alice fez questão de participar de cada processo da implementação do café na sua área. Participou ativamente do plantio, buscou por mais mulheres para avançar com a cafeicultura e contou com o suporte técnico da Cooperativa dos Cafeicultores do Cerrado (Expocaccer). Para quem não tinha conhecimento nenhum com a cafeicultura e abusando da própria curiosidade e vontade em produzir um café com boa bebida, Alice se surpreendeu logo na primeira colheita quando o café apresentou pontuação acima de 82 pontos.
“Eu precisava através dos cursos de café entender como tudo funcionava. Escolhi outras mulheres, moradoras da área para trabalhar junto comigo porque mulher é mais detalhista. Além de ter mais paciência, a mulher é tida como a fertilidade do solo há muito e muito tempo. Gosto de ter essa intuição e agir com base nelas, algo me dizia para trazer mulheres e nós fizemos assim. Em quatro dias plantamos 128 mil pés de café”, complementa.
Outro aspecto que deixa sua história ainda mais interessante é o fato de que na região de Bom Jardim, onde fica localizada sua produção, não é uma área conhecida por trazer os cafés de mais qualidade na cidade. Questionada sobre o segredo para se fazer cafés com pontuação relevante, Alice conta que foi ouvindo muito dos cafeicultores mais tradicionais, mas também aprendendo as novas práticas que chegam sem parar no campo. “Mesmo o básico do básico ainda é novo na minha caminhada, tenho e pergunto sobre tudo que fico com dúvida, procurei minhas inspirações como referência e fomos aplicando aos poucos”, comenta.
Toda área que hoje é de produção cafeeira antigamente era destinada ao gado de leite
Em relação ao pós-colheita, processo que ajuda a determinar a qualidade do café especial, Alice conta que trabalha com terreiro tradicional e terreiro suspenso, acompanhando ainda de perto temperatura, grau do brix e PH do café.
“No primeiro ano fizemos a medição da temperatura com termômetro de ordenha e deu super certo. Nossa primeira colheita foi de sete sacas por hectare, com pontuação de 83.75”, conta. No ciclo 20 a cafeicultura passou a também utilizar a técnica de fermentação e a pontuação avançou para 84 pontos e na temporada anterior, os cafés atingiram a marca de 85.25 pontos.
Para a safra de 2022, que chega com muitos desafios climáticos, Alice comenta que a quebra é inevitável, já que a seca castigou o parque cafeeiro no Cerrado Mineiro. As geadas atingiram uma pequena área da produtora, as chuvas do começo do ano aliviaram o estresse hídrico, mas a potência na produção deve ficar, se tudo seguir dentro do ideal, apenas no ano que vem.
Mesmo com os impasses climáticos, Alice comenta que o foco da produção continua sendo café de qualidade. “Eu penso que se a gente faz bem feito o lucro vem. Como vou beber um café de qualquer jeito? É um alimento e sempre me preocupei e pensei assim. Foco na qualidade da bebida e em ter sucesso assim”, acrescenta.
Além do café, a produtora rural destaca que convencer o pai de entrar em novas culturas trouxe novas oportunidades. Atualmente além da família manter a tradição em menor escala com gado de leite, gado de corte e de elite, também passou a produzir grãos – que antes era exclusivamente feito para silagem. “O café foi a melhor escolha que nós fizemos e abriu portas para outras oportunidades e hoje também estamos aprendendo a produção de milho e soja”, finaliza.
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